quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Blindness


From the film "Blindness", 2008


Embora já tivesse lido o livro de Saramago, agora que já digeri também o filme de Meirelles que fui ver esta semana, não posso deixar de aqui referenciá-lo. Por falar em digestão, não quero eu dizer que esta demora no processo da sua absorção se deva a algum mal-estar físico que o filme me tenha causado, embora seja sem dúvida um filme forte. Mas eu gostei muito de vê-lo! “Blindness” fez jus às metáforas e aos sentimentos que o “Ensaio sobre a Cegueira” do nosso escritor-nobel português já me havia despertado.

O único livro de Saramago que li completo até à data, quando alguns outros ficaram pendurados a meio. Não podia deixar de lhe prestar justa homenagem na sua passagem para o grande ecrã.

Fernando Meirelles, reconhecido pelos seus filmes “A cidade de Deus” e “O fiel jardineiro”, tal como o esperado, conseguiu a meu ver interpretar de forma quase perfeita o imaginário de Saramago. Se é que isto se pode afirmar.

Mas terá sido o próprio autor do livro original, durante uma conferência de imprensa conjunta com o realizador, quem afirmou que o filme lhe agradou “em todos os aspectos” e que se emocionou algumas vezes durante a passagem do mesmo. Para mim bastava olhar para o seu rosto no final da estreia do filme, imagens que têm andado a circular pelo mundo net, para perceber o seu índice de concretização pessoal. Naquele momento Saramago foi aos céus, e voltou fiel à vida.

Quanto ao filme, numa narrativa em que não chegamos a saber o nome de nenhuma das personagens, mas em que o anonimato lhes abre, no entanto, um lugar bem marcado na história, confrontamo-nos, mais uma vez, com questões do nosso tempo, que não nos facilitam uma resposta, mas nos incentivam a despertar para a sua existência mais profunda.
O colapso urbano e a complexidade da natureza humana, perante uma situação catastrófica e dramática, vão gerindo o balanço entre a ordem e o caos, entre a quietude e a agonia…que fui obrigada a digerir, com receio de sufocar.

E mergulhamos, ao vê-lo, nessa terapia conjunta: dolorosa é certo, pela brutalidade das imagens presentes (e paralelas); mas libertadora e alucinante, através de um trabalho de cinema plástico incrível, dos enquadramentos, dos flashes de luz branca, e dos reflexos pontuais, escolhidos de forma cuidada e séria, para não subverter as expectativas de todos os que já leram, e também visualizaram à sua maneira, o livro do escritor-nobel lusitano.

Em sintonia com Meirelles, os contributos de todos os outros envolvidos no projecto de “Blindness” foram preciosos, e não podem aqui ser negligenciados: Don Mckellar, na produção do argumento, César Charlone, na fotografia, e Marco António Guimarães, na brilhante banda sonora, entre outros.

Será também interessante, para quem tiver curiosidade, ler no blog do cineasta as dificuldades e tensões da etapa da montagem, em http://blogdeblindness.blogspot.com.

Para quem ainda não viu o filme, ou leu o livro, fica a minha recomendação. (Vale o que vale)

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